Um dos temas mais relevantes, quando o assunto é identidade de uma pessoa trans, certamente é a retificação de seu prenome e gênero no registro civil. De acordo com o artigo 16 do Código Civil Brasileiro “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome”, entretanto, para a comunidade trans esse direito por muito tempo foi dificultado, não havendo legislações específicas que garantissem a alteração legal de seus documentos.

Apenas em 2018, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou em conjunto a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 26 e o Mandado de Injunção n. 4733, ações em que o Grupo Dignidade participou como interessado, facilitando às pessoas trans o acesso a este direito, visto que foi definido a desnecessidade de processo judicial, cirurgia de redesignação sexual ou atestado psiquiátrico para que a alteração fosse feita. O procedimento é regulamentado pelo Provimento nº 73/2018 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que complementou a decisão do STF.

Hoje as pessoas trans podem fazer a retificação do prenome e do gênero/sexo nas certidões de nascimento e de casamento de pessoas transgênero e também na certidão de nascimento dos filhos, além de suprimir agnomes como “Filho”, “Neto” ou “Júnior”. Para divulgar essas ações e incentivar as pessoas trans e travesti a retificarem seus documentos, o Grupo Dignidade entrevistou as duas primeiras mulheres trans a terem o nome retificado com o auxílio, inteiramente, de nossa equipe. 

O entrevistador, Gabriel Santinelli, perguntou para as meninas, primeiramente, sobre como foi as suas experiências com a equipe de atendimento para o processo de retificação de prenome e gênero. Melina contou que foi muito bem recebida e atendida pelo pessoal do Grupo Dignidade, mas o título do seu processo acabou demorando um pouco para ser enviado para Curitiba, por causa do cartório de sua cidade. Nicole respondeu que “eles me trataram super bem, fui super bem atendida, em momento algum me trataram mal, me trataram super bem, fui bem acolhida, respeitada, melhor que qualquer outro lugar”, e apontou algumas dificuldades que encontrou no passado para corrigir os seus documentos:

Pra eu fazer minha certidão de nascimento, eu já venho correndo atrás dela faz muito tempo né, aí é aqui que eu consegui, faz um ano já que eu tentei correr atrás dela e não conseguia tirar porque lá por outros lugares é mais caro né, aí os advogados cobram 1600 reais para fazer uma documentação, aqui foi super rápido, eu paguei super barato, só as taxas, não foi caro, foi bem justo. Mas em outros lugares minhas amigas já fizeram e elas pagaram 1600 para fazer com os advogados, aqui foi bem rapidinho, foi um mês, paguei uns 200 reais, foi tudo!

As duas entrevistadas contaram que foram muito bem acolhidas e respeitadas por todas as pessoas da equipe, em especial pelo advogado e atual Diretor Administrativo do Grupo Dignidade, Mateus Cesar Costa. Em relação ao sentimento de receber a certidão atualizada, Melina afirmou:

Nossa eu me senti realizada. E foi tipo um dia antes de eu completar meu aniversário. Dia 11 eu recebi a certidão e dia 12 eu completei… foi um presente. Foi excelente, fiquei muito feliz.

Nicole também compartilhou do mesmo sentimento, de se sentir realizada: 

Ah foi um sonho pra mim, porque toda mulher trans realiza-se em ter pronome feminino no RG, pra mim foi um sonho. Me sinto muito bem realizada.

Em seguida, ao ser questionada sobre a importância do processo de retificação de prenome para a comunidade trans, Melina relatou que já passou por muitos constrangimentos porque as pessoas a chamavam pelo nome que estava em sua certidão. “Em postos de saúde, essas coisas… às vezes eles me davam observação, ou então eles não colocavam observação e chamavam pelo meu nome, então me deixava constrangida”. Para Nicole:

É muito difícil a gente que tem uma identidade feminina chegar com um nome masculino, e os outros vem você de prótese, bunda assim, e te identificam como homem né, é muito difícil pra gente né. Aí você vê o preconceito alí, aí você já fica furiosa, porque os outros são obrigados a tratar a gente no feminino né, por mais que a gente tenha o sexo ‘masculino’ eles tem que nos tratar no feminino porque nós temos uma identidade feminina.

Por fim, o entrevistador finalizou as conversas pedindo que as meninas fizessem sugestões ou comentários sobre o seu processo de retificação de prenome e gênero. Melina dirigiu a sua última fala para quem deseja retificar os seus documentos:

Para as meninas trans, pra quem quiser fazer esses nomes, é super de boa. Pode fazer […]. Nossa não tenho nem o que falar assim, porque é muito bom, muito bom mesmo. Só foi um pouquinho demorado o processo por causa do cartório que é de lá mesmo, dos juízes de lá. No geral foi bem tranquilo, bem rapidinho.

Já a Nicole fez um comentário para a equipe do Grupo Dignidade:

Eu queria comentar que vocês estão de parabéns, continuem assim, porque esse é um sonho para muitas, muitas e muitos tem esse sonho, e é muito difícil passar por essa barreira, só nós que somos trans, gays, sapatão, a gente que quer trocar os nomes sabem as barreiras que a gente tem que passar, não é fácil.

Onde Buscar Atendimento?

O Grupo Dignidade, além de oferecer atendimento jurídico e psicológico para a comunidade LGBTI+, dá o suporte necessário para que as pessoas trans e travestis possam realizar a retificação de prenome e gênero e a retificação dos demais documentos, visto que é preciso emitir novos documentos retificados depois de se conseguir o novo registro civil.

A equipe de retificação de prenome e gênero é inteiramente voluntária. No setor já passaram os seguintes voluntários: Aline Ferreira da Silva, Bianca Silva Carmona e Josiane de Lima. Atualmente a equipe é formada por Julia Mongelos, Branca Nogueira e Silva e Lucas Dalla Vecchia de Oliveira, e coordenada por Mateus Cesar Costa, diretor administrativo do Grupo Dignidade. Os atendimentos ocorrem todas as terças, das 14h até as 18h e necessitam de agendamento prévio. O telefone do Grupo Dignidade é (41) 3222-3999 e o horário de funcionamento é das 13h até 18h, de segunda a sexta.