Apesar de recurso da decisão anterior, no caso do ativista e militante Toni Reis e uma segunda vítima ligada na época ao Grupo Dignidade em Curitiba, que sofreram ameaças de morte e outros atos LGBTIfóbicos, o Tribunal de Justiça do Paraná arbitrou que o perpetrador deverá pagar o valor de R$ 30.000,00 de indenização por danos morais.
Em 07 de outubro de 2012, Toni Reis, diretor executivo do Grupo Dignidade (organização LGBTI+ sediada em Curitiba) recebeu uma ligação telefônica feita de um orelhão no bairro Água Verde, Curitiba, Paraná com uma voz masculina que fez a seguinte ameaça: “Você deve morrer, você, seu marido e seu filho. Sua mãe é uma sapatona”.
Foi o início de dois anos de ataques constantes, por telefone, e-mail e mídias sociais a várias pessoas ligadas ao Grupo Dignidade. No caso de Toni Reis, além das ameaças de morte, o criminoso se utilizou do nome dele e mandou e-mails falsos, com conteúdos extremamente ofensivos, para todos os Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, Presidentes das Seccionais da OAB, formadores de opinião em Curitiba, para o Governador do Paraná, para o jornalista Fábio Campana, Senadores e Deputados. O Presidente da OAB do Mato Grosso do Sul o processou, porque foi ameaçado de morte através de perfil falso que usou o nome de Toni Reis.
As palavras dos e-mails eram de baixo calão, a exemplo deste, recebido em 2013:
“Vão tomar no c* lésbicas e gays, bando de filhas da p*** , antes de matar vcs, tem que fazer vcs sofrerem, cortando todos os dedos das mãos e dos pés e depois a morte com a cabeça cortada e com sangue jorrando em praça pública, pq nenhum pai, mãe e família em geral tem orgulho de ter uma desgraça, uma merda sapatão e viado na família.”
Em função das ameaças de morte, Toni Reis até chegou a ser incluído no Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos do Governo Federal. Além disso, a Fundação de Ação Social (FAS) de Curitiba recebeu uma denúncia de que Toni Reis estava abusando sexualmente do filho dele. O Conselho Tutelar e a FAS foram até a escola do menino, para investigar, gerando uma situação constrangedora para todos.
Na decisão recorrida, a juíza Danielle Maria Busato Sachet, da 2ª Vara Cível de Curitiba, havia afirmado que:
“As mensagens e publicações em questão registram uma extrema intolerância do requerido em relação aos autores e às pautas que defendem, promovendo ódio e preconceito contra minorias, especialmente no que concerne à população LGBT, motivo pelo qual foi condenado em primeiro grau pela prática de crime de calúnia e difamação, ambos majorados (mov. 1.9/1.13).”
A magistrada arbitrou o valor de R$ 15.000,00 de indenização por danos morais para cada um dos autores, totalizando R$ 30.000,00. O valor foi mantido apesar do recurso impetrado.
Para o advogado Rafael Kirchhoff, do escritório Kirchhoff & Silva Advogados, que representou os autores:
“A manutenção da condenação ao pagamento de indenização pelo Tribunal de Justiça do Paraná reafirma a proteção jurídica da dignidade da população LGBTI também no âmbito civil. O Poder Judiciário local já havia reconhecido essa proteção na seara criminal para os mesmos fatos. É um passo importante para a prevenção de atos de discriminação praticados virtualmente, e também um precedente no Estado contra a discriminação LGBTIfóbica em qualquer ambiente”.
Nas palavras de Toni Reis:
“Em 13 de junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a discriminação e a violência LGBTIfóbicas são uma forma de racismo e puníveis como tal pela lei, estabelecendo o seguinte: ‘Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08/01/1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”)…’. Assim, é muito importante que as pessoas que estejam sendo discriminadas, sofrendo violência, registrem Boletim de Ocorrência na delegacia mais próxima, denunciem no Disque 100, na Central Nacional de Denúncias LGBTI+, busquem as Defensorias Públicas e os Ministérios Públicos, para não deixar passar em branco. Direitos iguais, nem menos, nem mais. Processe. Se perder a ação, recorra até o Supremo Tribunal Federal.”
Nas palavras da outra vítima:
“Quase 9 anos depois da primeira ameaça de morte, um pesadelo que durou quase 2 anos, recebo hoje a carta da condenação do responsável por elas. Um processo criminal que resultou em uma pena branda por ter sido cometido pela internet, mas de uma importância enorme pelo que representa! #homofóbicosnãopassarão #machistasnãopassarão
Obrigada Dr. Rafael Kirchhoff e Toni Reis por toda a luta!”
Nosso agradecimento especial às seguintes instituições: o Núcleo de Combate aos Cibercrimes, da Polícia Civil do Paraná, a Polícia Federal, a Secretaria de Direitos Humanos da então Presidência da República, o Ministério Público e a Comissão de Diversidade da Ordem dos Advogados do Brasil e a Alta Comissária dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas.